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Convite Oscar Araripe / Medalha da Comenda Lyda Monteiro da Silva

Yus quae sera tamem / Justiça ainda que tardia este deveria ser o lema e até mesmo o grito da Justiça de Transição, esta nova, bela, ampla e necessária forma de resgate dos direitos negados e das injustiças esquecidas. Para mim, artista e anistiado político, receber esta medalha é como ganhar uma nova anistia, tão bonita e significativa quanto àquela, só que agora concedida por uma entidade civil de suma importância, pois representa os advogados, a Justiça e o Direito.

Muito se falou, mas nunca o bastante, sobre os horrores da Ditadura de 64. Mas, um aspecto, importantíssimo, permanece não dito ou muito pouco analisado. Refiro-me ao que poderíamos chamar de repressão amiga; ou seja, naqueles tempos de chumbo, que prefiro chamar de kriptonita, pois éramos todos jovens super-heróis no combate à Ditadura, as pessoas que nos amavam, nossos pais, parentes e amigos não queriam saber da resistência, ainda que a achassem justa, e até mesmo evitavam falar sobre isto, com medo que tal militância ou mesmo a oposição democrática pudesse nos levar à prisão, à perseguição ou a morte. Esta realidade, terrivelmente angustiante, com certeza, levou muitos de nós à alienação, política e social, e à inversão dos valores da Justiça e da Democracia.
Assim, louvo com a razão e emoção esta gloriosa iniciativa da diretoria da Caixa de Assistência dos Advogados de Minas Gerais, a CAA-OAB/MG, aqui representada por seus diretores, Sergio Murilo Diniz Braga, Wagner Parrot, Ronaldo Armond, Diogo José da Silva, Fabiana Faquim, José Luiz Ribeiro de Melo e Pollyanna Quites -, ao criar, pioneiramente, esta justa e oportuna honraria, a medalha da Comenda Lyda Monteiro da Silva.
Devemos lembrar, sempre e constantemente, os bem-feitos e malfeitos da humanidade. Não é bom, nada bom, que a Justiça morra, não se fazendo presente ou célere, e que tanto os carrascos quantos os mártires sejam julgados pela Justiça e pela História. De modo que vale muito lembrar um pouco da história de Dona Lyda:
Em 1980, quando o Brasil clamava por uma abertura política, a OAB participava ativamente na luta pela defesa do Estado Democrático de Direito. Bons tempos aqueles. Em 27 de agosto chegou à entidade uma carta com explosivos endereçada ao então presidente, Eduardo Seabra Fagundes, que atuava também como delegado do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. Seabra realizava uma campanha pública para identificar agentes dos serviços de segurança suspeitos de sequestrar e torturar o jurista Dalmo de Abreu Dallari, aliás, por coincidência, meu colega bolsista em duas summer schools na Universidade de Harvard, nos anos 60.
Lyda Monteiro da Silva, então secretária da presidência, foi quem abriu a carta. A explosão lhe decepou o braço, além de outras mutilações, e provocou a morte tão logo foi hospitalizada. Lyda, que trabalhou por mais de 40 anos na Ordem dos Advogados do Brasil, tendo ocupado também o cargo de Diretora do Conselho Federal da OAB, simbolizou a luta da OAB pela democracia. Sua morte fez crescer a autoridade da OAB na luta pela retomada do processo democrático. Seu enterro, acompanhado por mais de cinco mil pessoas, transformou-se numa manifestação política de vulto. O dia de sua morte, 27 de agosto, tornou-se o Dia Nacional de Luto dos Advogados.
Como disse, e muito bem, o Dr. Sergio Murilo Diniz Braga, presidente da CAA-MG: "esta comenda é dedicada a personalidades que lutaram pela democracia e a justiça social”.
Dona Lyda, mártir da redemocratização, é, pois, um ícone na luta da sociedade contra todas as formas de opressão, inclusive contra o silêncio dos que se calam diante delas ou, pior ainda, as apoiam.
De modo que recebo esta homenagem com o merecimento dos que militaram e militam nesta luta, infelizmente às vezes rediviva, mas sempre encontrando nos resistentes o canto altissonante da liberdade e a certeza da justiça social sempre almejada. 
A Liberdade pode e deve ser também considerada uma questão estética. Não existe beleza na miséria. Todo belo é livre. Como a Liberdade, a Beleza é indizível e somente reconhecida quando vivida. Não há arte injusta nem Justiça sem arte.
Esta Comenda, em homenagem à Dona Lyda Monteiro da Silva, tem a beleza da arte porque é justa e canta em alta voz a Liberdade da paz social.

POSTAGEM enviada por Oscar Araripe


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