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A terceira margem do rio - Momento Musical


Por Ivan Pereira Santos Júnior - compositor, pianista e poeta
  
A terceira margem do rio. — Em uma célebre passagem — talvez, a mais memorável — do filme Copying Beethoven, co-produção norte-americana, alemã e húngara de 2006, dirigido pela polonesa Agnieszka Holland, cujo título fora curiosamente traduzido para o português como "O Segredo de Beethoven" ou "Corrigindo Bethoveen", que ficcionalmente relata o último ano de vida do compositor, este, meditativo, em diálogo com sua assistente, Anna Holtz, interpretados por Ed Harris e Diane Kruger, pondera: 


"- Música? A vibração no ar da respiração de Deus... fala à alma dos homens. Música é a língua de Deus. Nós músicos estamos o mais perto que os homens podem estar de Deus. Nós escutamos a sua voz. Nós lemos os lábios Dele. Nós damos à luz aos filhos de Deus. Cantamos suas preces. Isso é o que os músicos são, Anna Holtz.

         Nietzsche, em seu “Crepúsculo dos Ídolos”, remata: 


  Sim; a música, em meio a todas concepções artísticas, a mais abstrata delas, é a que mais fala, e fala mais alto, do íntimo às mais altas Esferas, um confessionário, cambiando cores, alternando sensações, emoldurando paisagens, criando figuras, arrebatando o espírito, erigindo cenários, sustentando valores, a servir de rotunda a dramaturgos, poetas e pintores; graças à sua universalidade, é a linguagem perene da alma, a traduzir o ideário de fraternidade e igualdade entre os homens, por não conhecer fronteiras — justamente porque seu destino não é a mente, mas o coração. 

         Inspirado tanto na película, assistida tantas e tantas vezes, quanto no pensamento do filósofo do “eterno retorno”, creio constituírem músicos pontes entre Deus — ou a divindade sustentada pelos profitentes de inúmeras crenças — e os homens; e compor, tocar, pensar música, exercitar atividades a ela correlatas são exteriorizações de uma mesma e axial realidade da alma, maneiras de ela colocar-se acima da pequenez, da mesquinhez, da mediocridade, do egoísmo, e, do cume da montanha, vislumbrar o entorno com mais aguçado olhar.

         Tecendo despretensiosas linhas introdutórias quanto àquela que julgo considerar a viagem musical que empreenderemos, a convite de meus estimados amigos do Clube de Poetas do Litoral , apresento esta que é a primeira dentre uma série de publicações, nesta coluna dedicada à Música, cujo objeto serão curiosidades, citações, aspectos teóricos, formas e gêneros musicais, a vida dos grandes compositores, relação com outras manifestações de arte. Estendendo o convite a você, meu amigo ou minha amiga, conforme expressei, disse “empreenderemos”, assim, no plural, por acreditar que a música incita-nos a ouvi-la, senti-la e apreciá-la não como a experiência solitária de quem observa um curso d´água, diante do dado meramente real, mas como a idêntica e indecifrável sensação que o poder da música de Mozart exerce sobre o ouvinte: Percorrer verdes campos, cruzar estradas sinuosas, desvendar extensos vales, sempre de braços dados com o compositor, numa jovial e ingênua corrida — e, dessa feita, divisar, com os olhos imateriais, a terceira margem do rio.


Santos, 06/06/2012





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